Onde as velhas não têm vez

Sorria, senhora, sorria, peça por favor e agradeça

Sorria, senhora, sorria, peça por favor e agradeça

Por L’Andreis*

É quarta-feira, final de tarde. Consegui sair da produtora mais cedo e achei que seria lindo passar no mercado antes para agradar o casamento. Já na fila do pão, a tragédia começa. São sete, sete velhas que chegaram antes de mim no supermercado.

Há uma esquete do Terça Insana em que um personagem xinga diversos estereótipos que cruzam seu caminho, mas a melhor parte é quando ele diz “prefiro ter um filho viado, que ter um filho veia”. Compreensível, as senhoras idosas têm mais tempo para saracotear e conversar e acabam sendo uma distração ou empecilho aos jovens na correria do dia-a-dia.

De volta ao supermercado, a senhora no. 1 não decidiu se quer levar pão integral ou pão normal e conversa com sua colega do lado sobre SAÚDE, distribuindo informações sobre sua flora intestinal que ninguém ali precisava saber. O famoso “papo de velha” é algo que espanta os jovens de suas avós e tias-avós. Ele começa com como vai, entra em como está a escola ou o trabalho e termina sobre como foi o dia cozinhando ou vendo TV e sempre falando de dores e doenças. Claro, aí estamos falando de senhoras que não são phinas.

A primeira vez que eu vi uma em Porto Alegre, ela usava um cintilante tailleur combinando com seu cabelo de cor bem viva. Uma bengala (phina, phina, phina) a ajudava a entrar no cinema da Casa de Cultura Mário Quintana onde ela ia assistir, junto com a neta ou bisneta, creio, a Violência Gratuita (o primeiro). Além de todas as escolhas, provando a phinesse, a senhora ainda contava que iria ao cinema novamente amanhã. Velha e bem ocupada, pensei com minha cabecinha de 1999.

Na minha frente da fila, é a vez de outra senhora. A dúvida dela é sobre quantidade. Depois de algum tempo, decide que só vai levar UM. Mas ela sorri, e todos a perdoam. Já a próxima senhora chega xingando as atendentes. Viram O Lutador? Pior. Velha rabugenta maltratando pessoas que lhe servem: 0 na phinesse. Esse tipo de pessoa acaba por comer muito cuspe de garçom na (curta) vida. E aqui vai a dica: não é porque você é idosa que pode gritar com as belas atendentes do Zaffari. Sim, elas são jovens, sim, elas estão em forma, sim, a maquiagem delas é over, mas elas não estão ali para serem humilhadas, já basta o salário mínimo e passar o dia ao lado do forno. Sorria, senhora, sorria, peça por favor e agradeça. Não te ensinaram isso na escola? Ah, foi há muito tempo? Dá pra voltar sempre. Todo o dia é dia.

Saí do Zaffari perdendo a phinesse nas estribeiras. Odiando as moçoilas com idade. Pensando naqueles abrigos de tactel, naquelas batas floreadas, no TAI-DAI e odiando. Em casa, pensando melhor, lembrei que aquilo foi uma amostra ruim. Há minhas tias-avós que falam de viagens pelo mundo, Dona Metsavah, primeira mulher formada em filosofia em Little Italy e que nunca esconde os sucessos dos filhos, e deve haver outras que não terminam as conversas com “fica com Deus”. Mas o que mais me acalmou é prever que, talvez muito pelas dicas desse blogue + muita pretensão da minha parte, criaremos uma cultura melhor para as futuras vovós, que serão admiradas por sua sabedoria e boas escolhas de roupa. E jamais, jamais, vão tratar subalternos mal pela simples razão que tratar mal não existe no universo delas. Nem quando Lulu, a yorkshire, faz xixi no tapete persa.

*L´Andreis espera que a menopausa chegue logo. Enquanto não vem, ela taca-lhe anti-rugas da VICHY e muito pilates no corpo, já que além de educada, vai ser uma velha gata. Está envelhecendo sempre aqui, às quintas, e jura que vai ficar a cara da Maria Callas quando as rugas aparecerem.

13 Comentários

Arquivado em L’Andreis, lição de vida, vergonha alheia

13 Respostas para “Onde as velhas não têm vez

  1. Antes eu pensava que o acúmulo dos anos fazia algumas pessoas ignorarem o respeito ao próximo. Mas mudei de idéia. Acho que a idade não deixa uma pessoa melhor ou pior, só mais velha. Idosos grosseiros e estúpidos foram jovens grosseiros e estúpidos.
    Garçons, por gentileza, cuspam no prato dos mal-educados de todas as idades.

  2. Conheci uma senhora que estava muito triste porque havia perdido o marido. Ganhou da filha um computador e conheceu via chat uma outra senhora nos Estados Unidos.

    Hoje, viaja todos os anos para os States para encontrar o seu novo amor. É o tal lesbian chic na terceira idade. Fui super a favor.

    Além de colocar a periquita para fazer exercícios, treina o inglês e deve ser muito, muito feliz.

    Tem como não amar esse tipo de senhorinha?

  3. Di

    Esse tipo de senhora são dignas de pena, pois durante sua vida não tiveram tempo para se divertir e hoje são ”idosas’ de pouco educação e nada phinas!

    Nossa geração terá mais phinéssi ao chegar nessa idade, graças a vocês!

    😉

  4. Monica

    Ok, concordo. Agora mora num país de velhos (e.g. Portugal) para ver o que é velho chato, ranzinza e mal-educado. TODOS os lugares são tomados por eles. No ônibus, praticamente nem tem assento reservado, porque todos os assentos são para eles. Eles não respeitam fila, não respeitam nada. E reclamam, reclamam. Agradeço por não entender metade do que eles falam.

  5. L´Andreis

    Nossa, Mônica!
    Estou agradecendo também por não estar no dia-a-dia de Portugal. =)

  6. Rougée

    Ótimo post, L’andreis!

    E, fazendo um paralelo com o post da Darko, vocês nunca tiveram o ‘prazer’ de sentar no ônibus ao lado de um velho fedido?

  7. Caroline Andreis

    Infelizmente,somente em um avião Madrid-SP (12 horas de vôo). Um russo que não sabia o que era água de chuveiro.

  8. L´Andreis, creio que falta de educação e mau humor não tem idade, tu iria chegar as riscas de perder a phinéssi se estivesse na fila do Zaffari com um bando de jovenzinhos sem noção também.
    E, claro, tomara que sejamos idosos phinos!

  9. Caroline Andreis

    Concordo, Alice.
    Deve ter sido o horário.
    Mas creio que há peculiaridades na chatice velha como se sentir superior por já ter vivido muito.E o “Fica com Deus”. Não suporto o “Fica com Deus”, prefiro ficar com Jesus. Luz. heh.

  10. Carol (super íntima hahaha) nesse caso eu adoraria dizer:
    – Jesus, apaga a luz! ;]

  11. leo

    é. realmente não é difícil identificar um velho mala.

    alguns sintomas básicos:

    sabe tu-do sobre o estatuto do idoso. de cor. apesar da senilidade.

    dá muuitos conselhos, pois realmente acredita que idade e sabedoria andam juntas, de andador e pantufas.

    abençoa as pessoas, porque se julga mais próxima de Deus…

    ai que saudade do meu vô, que tocava gaita ao lado da lareira, bebia muito café com grappa, tinha um relógio de bolso e um estojinho de rapé de madrepérola lindos e, metaforicamente, é claro, se dizia velho demais pra segurar peido…

  12. Dias atrás, vi uma velhinha e um velhinho discutindo na rua. Eles vinham em direções opostas, um de encontro ao outro, e nenhum deles desviou: bateram de frente. O argumento de ambos era que um estava no caminho do outro. Sei lá quanto tempo ficaram se xingando até descobrir que a calçada é pública…

  13. duvidosa idade

    pergunto: com que idade devemos nos suicidar a fim de evitar a velhice?
    Onde e quando ela começa? para onde vou quando ficar velho? quem serei ao ficar velho? de onde vim antes de ficar velho( esta resposta vai demorar).

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